Como deve ser um programa de formação que apoia o professor a lidar com as próprias emoções para que depois ele consiga criar um clima favorável ao aprendizado dos alunos
Por Marcela Almeida, publicado com exclusividade na plataforma Porvir.
Um dos aspectos mais desafiantes no campo da aprendizagem socioemocional diz respeito à formação de professores. Muitos dos programas criados para o desenvolvimento das habilidades socioemocionais na escola são voltados para os estudantes, e os professores são instruídos para lecionar e aplicar a metodologia em sala de aula.
No entanto, os desafios apresentados pela maioria dos professores ao trabalharem com currículos de aprendizagem socioemocional, vão muito além dos conteúdos que devem ser ministrados em sala de aula. Dentre os diversos aspectos que envolvem o exercício e as condições da sua profissão, uma questão se destaca: como lidar com as próprias emoções e fortalecer as competências socioemocionais, para criar um clima favorável ao aprendizado dos alunos?
No título “Formação de professores e profissão docente”, de 1992, António Nóvoa aborda a questão do desenvolvimento pessoal como um aspecto importante a ser levado em conta na formação de professores. Há a necessidade de se criar espaços de interação entre as dimensões pessoais e profissionais do professor para permitir que eles se apropriem dos processos de formação, dando-lhes um sentido no quadro das suas histórias de vida.
O desenvolvimento de competências socioemocionais é um processo reflexivo, experiencial, interativo e dinâmico, portanto, é fundamental que o professor possa ser o protagonista em seus processos de formação, e não apenas capacitado para lecionar estes novos conteúdos aos alunos.
Katherine K. Merseth, professora sênior da Faculdade de Educação da Universidade de Harvard (Estados Unidos), no livro “Desafios reais do cotidiano escolar brasileiro”, descreve uma abordagem pedagógica denominada método de instrução de casos, que são materiais didáticos chamados casos de ensino, com o objetivo de contribuir para o aprimoramento pessoal e profissional dos professores e inspirá-lós em suas práticas escolares.
Na obra, são apresentados 22 casos, com relatos de situações vividas por professores no cotidiano escolar brasileiro, trazendo à tona dilemas, desafios e oportunidades da profissão docente para serem discutidos em grupo.
A ideia de levar para a formação de professores casos de ensino tem como propósito envolver os participantes no exercício de buscar e analisar possíveis soluções para esses contextos escolares. Dessa forma, os professores têm a oportunidade de reconhecer os conflitos e situações que são parte da sua realidade profissional. E, ao assumirem uma perspectiva investigativa sobre a situação, entram em contato com suas emoções, pensamentos e comportamentos, o que é a base para o desenvolvimento das competências socioemocionais.
Em relação às questões coletivas, uma formação de professores amparada em dilemas escolares, facilita as dinâmicas de interação e participação conjunta na solução dos casos, o que estimula a cooperação, a empatia e a resolução de conflitos. Assim, ao ouvir as interpretações e sugestões dos outros colegas de profissão, os docentes podem refletir sobre novas ideias e abordagens para melhorar suas práticas e sua experiência profissional. Ou seja, os casos de ensino tornam-se materiais vivos para o desenvolvimento das competências socioemocionais dos participantes.
Estimular o debate por meio de estudos de casos, pode ser um caminho para apoiar professores e prepará-los não só para os conflitos inerentes à atividade docente, mas também para lidar com estas novas abordagens socioemocionais que adentram o contexto escolar.
Ao fortalecer suas próprias competências socioemocionais, os professores melhoram sua autoestima, sua autoconfiança, sua habilidade relacional e passam a exercer a empatia, conectando-se com seus alunos, seus sentimentos e necessidades. São também motivados a criar um clima favorável ao aprendizado, levando em conta não apenas os conteúdos a serem ministrados, mas também os aspectos socioemocionais dele e dos estudantes.
Além disso, uma formação de professores que leva em conta o desenvolvimento pessoal, aposta nesse profissional, acreditando que progressivamente ele consiga melhorar suas condições de ensino e assumir o seu valor fundamental para a sociedade, o papel de educador.
Marcela Almeida é diretora pedagógica do Instituto Vila Educação.
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